Editorial
Filosofia na Formação Médica
por Gustavo Adolfo Kuriyama Massari
Coordenador de Mídia da AAC
Assim que comecei a cursar medicina, logo no primeiro semestre, em análise das aulas que enfrentaria durante o curso, me deparei com matérias de cunho filosófico e sociológico que me deixaram, de certa forma, assustado pelo fato de estar cursando medicina, não um curso de ciências humanas. A partir daí, comecei a refletir mais sobre os porquês desse conteúdo na formação médica; e mediante a isso, resolvi escrever um pouco da importância daquilo que me fez assustado no início da minha faculdade.
Já no contexto histórico, nota-se a estreita relação da Medicina Hipocrática e a Filosofia do Homem por terem crescido juntas, no luminoso “século de Atenas”. Doutrina e prática médica, de um lado, e filosofia do homem e ética, de outro, foram produtos de um mesmo clima cultural.
O tema “formação médica” encontra-se, mundialmente, em ampla discussão e revisão teórica há mais de 30 anos. A área médica não dispõe dos elementos imprescindíveis para reflexão e apresentação formal das suas questões estruturais sendo necessário o auxílio teórico das Ciências da Educação e, precisamente, das diretrizes Filosóficas. Sendo assim, houve a criação do Projeto CINAEM (Comissão Interdisciplinar Nacional de Avaliação do Ensino Médico) desenvolvido durante a década de 90 do século XX que é uma manifestação evidente da preocupação com os rumos da formação médica brasileira e que mobilizou vários segmentos sociais.
A filosofia, à qual o aluno é apresentado nos primeiros anos do curso de medicina, intervém em sua visão sobre o mundo ao relativizar a importância do senso comum em paralelo ao conhecimento científico, expondo como tal profissão é permeada por sérias decisões e questões éticas. Também, a filosofia no curso de medicina é a responsável por possibilitar ao acadêmico a capacidade de estabelecer pontes sobre modelos de pensamento, possibilitando a reorientação do olhar sobre os aspectos subjetivos do adoecimento, compreendendo de maneira ampliada o processo de saúde-doença, além de temas mais complexos, como o aborto no cenário brasileiro.
A filosofia é o operador teórico base para o futuro médico ser capaz de se solidarizar e ser empático para com a dor alheia, entender como o paciente observa seu adoecimento, ser capaz de analisar sua realidade psicossocial e, acima de tudo, perceber que não são somente as informações descritas na literatura que norteiam a prática médica ideal, mas sim, as perguntas, em uma minuciosa anamnese. Assim, essa ciência exerce papel imprescindível na formação ética-humanista médica.
Portanto, a necessidade de reestruturação da relação médico-paciente advém da uma demanda dos pacientes por médicos que sejam capazes de cuidar, e não apenas medicar; que saibam interagir, sendo éticos e descentes. Tal capacidade é permitida pela visão holística do doente inicialmente construída e trabalhada nas disciplinas humanísticas. Portanto, o estudante de medicina, assim como nas demais áreas do conhecimento, deve compreender a inexorável relação da formação universitária aliada à filosofia.