Matéria Especial
A amamentação reduz realmente o risco cardíaco em mulheres?
Por Bianca Alves de Miranda
Coordenadora de Estágio da AAC
Atualmente se entende a amamentação como um ato fisiológico e biologicamente determinado, que é influenciado por vertentes emocionais, sociais, culturais e políticas. Num passado recente foi estimado uma diminuição da prática tradicional da amamentação, mesmo que involuntariamente, por razões como o emprego da tecnologia moderna na assistência ao parto, e uma substituição da alimentação com leite materno por fórmulas pediátricas, dentre outras motivações socioculturais.
Diversas são as vantagens do aleitamento materno, tanto para a mãe quanto para o recém-nascido, principalmente no que diz respeito ao estabelecimento de um vinculo afetivo. Quanto à fisiologia, diversos mecanismos estão envolvidos nos benefícios do aleitamento, como o contato pele a pele, a colonização do intestino do recém-nascido por microrganismos da flora materna, a imunização, a manutenção da temperatura corporal adequada, a fim de evitar hipotermia. Ainda, a sucção do colostro induz um mecanismo laxativo que ajuda na prevenção e na redução da icterícia fisiológica por estimular movimentos peristálticos com a consequente eliminação do mecônio e reabsorção da bilirrubina através do circuito êntero-hepático, prevenindo também a hipoglicemia.
Contudo, além dos benéficos para o bebe, mais se sabe atualmente sobre os benefícios observados no corpo da mãe com a amamentação. Precocemente observa-se a sucção do mamilo como um estímulo a hipófise na produção da prolactina e da ocitocina, culminando na produção láctea, que induz o útero a contrair-se, auxiliando na involução uterina e diminuindo o risco de hemorragia após o parto, alem de inibir a ovulação. Através deste mecanismo se estabelece um raciocínio acerca dos benefícios da amamentação como protetor ovariano e da mama para o aparecimento de neoplasias, de forma que comprovadamente mulheres que amamentaram em algum momento da vida têm entre 8%-12% menos chances de desenvolver estes tipos de cânceres.
Uma das principais e mais novas descobertas sobre a amamentação e os benefícios para as mulheres é no que diz respeito à saúde cardiovascular. Acredita-se que há uma redução do risco de no desenvolvimento de doenças cardíacas porque, ao amamentar, as mulheres diminuem os depósitos de gordura no corpo, que sabidamente estão envolvidos na síntese aterosclerótica e na resposta ao cortisol, grandes componentes das injurias cardiovasculares.
Recentemente um estudo do American Journal of Obstetrics & Gynecology esclareceu um pouco sobre o mecanismo envolvido nesta teoria. A pesquisa avaliou mais de 100 mil mães, e 63% destas já haviam amamentado. Os pesquisadores levaram em consideração fatores como idade, número de partos, peso, histórico familiar, dieta e sedentarismo, trazendo a primeira evidência de que o tempo acumulado de amamentação pode influenciar a saúde cardiovascular no longo prazo, e o resultado foi que aquelas que amamentaram por mais de um ano tiveram 10% menos risco de sofrer acidentes vasculares e doenças cardíacas.
Em suma, a gestação facilita um aumento na quantidade de gordura visceral e nos níveis de lipídios e triglicérides, além de propiciar resistência à insulina, sobrecarregando o sistema cardiovascular da mãe. A amamentação, por todos os mecanismos supracitados, induz e ajuda a recuperar o perfil metabólico de antes da gravidez. Outra hipótese levantada neste estudo é a de que a amamentação tenha um efeito antiestresse de longa duração, devido à ocitocina, que melhora a resposta ao estresse, e consequentemente reduz a injúria causada pelo excessivo efeito autonômico e do cortisol envolvidos no mecanismo do estresse, sob o sistema cardiovascular.
De forma geral, a amamentação, um ato que mescla princípios emocionais, afetivos, fisiológicos e culturais, sempre se mostrou um ato natural e de amor. Atualmente se discute as bases científicas envolvidas nos demais órgãos e sistemas beneficiados pelo aleitamento. Assim, certamente este ato deve ser estimulado pelos profissionais de saúde visando sempre a saúde de ambos, mãe e bebê, a curto e a longo prazo.